domingo, 4 de julho de 2010

Silêncio - saber para além da razão.


Estou lendo um livro de Carlos Castaneda, "O Poder do Silêncio: novos ensinamentos de don Juan".

Para quem não sabe, Castaneda, nascido no Brasil, foi fazer sua tese de doutorado em antropologia, pela Universidade da Califórnia, sobre ervas medicinais e ritualísticas usadas pelos índios em Sonora, no México, e acabou fazendo sua iniciação espiritual com um índio que, no livro, chama-se don Juan Matus. A partir daí escreveu uma série de livros tais como "A erva do diabo" e "Viagem a Ixtlan", meus próximos.

A feitiçaria, nesse contexto, é entendida como conhecimento formado a partir da antiga cultura tolteca pré-colombiana que envolve o uso de potenciais do espírito. As narrativas sobre seus mestres, os potenciais de uso da mente, e a busca interior de cada personagem são uma riqueza que contrasta com a materialista cultura do ocidente.

Estou adorando!

Um dos convites deste livro é o ultrapassar da razão: "complicamos as coisas tentando tornar razoável a imensidão que nos rodeia." p.47.

Quero compartilhar um diálogo entre Castaneda e d. Juan. Porque uma grande dificuldade em nossa busca espiritual está em compreender que o conhecimento pode existir sem palavras para explicá-lo.
Uma questão filosófica que está na raiz de todas as experiências místicas: é impossível explicar a experiência de união com Deus.
E, diga-se de passagem, está na raiz também dos insights científicos: o conhecimento antecede os passos racionais das teorias.

Creio que don Juan quer ensinar que o primeiro passo será abrir mão da razão que te conduziu até aqui.

"- Conhecimento e linguagem são separados - repetiu suavemente (...)
- Já lhe expliquei que não há maneira de falar sobre o espírito - continuou - porque espírito pode ser apenas experimentado. Os feiticeiros tentam explicar essa condição quando afirmam que o espírito não é nada que você possa ver ou sentir. Mas está pairando sobre nós o tempo todo. As vezes vem para algum de nós. Durante a maior parte do tempo parece indiferente."

Fiquei quieto. E don Juan continuou a explicar. Disse que de muitas maneiras o espírito era uma espécie de animal selvagem. Mantinha distância de nós até o momento em que algo atraía-o. Era então que o espírito se manifestava.

- (...) sem a menor chance ou desejo de compreendê-lo, um feiticeiro manipula o espírito. Reconhece-o, acena-lhe, convida-o, familiariza-se com ele, e expressa-o através de seus atos."
p. 54 e 55.

Espero que cada um encontre bons caminhos para realizar o espírito em suas vidas!

Um comentário:

  1. André, você fala de imensidão, o que me reporta a pensar na grandeza, na infinitude que certas paisagens nos despertam. Paisagens escritas, inclusive, poéticas... Lembro-me de "A surpresa do mundo, de uma teóloga e matemática portuguesa chamada Teresa Vergani (2003). No percurso da leitura, você encontra Transitando III: O homem segundo o “livro das mutações” (nós somos a carne dos textos que comemos), adaptação e síntese construída pela autora, a partir de um comentário de Jay Ramsay ao I Ching. Dessa síntese recolho alguns fragmentos:
    "As coisas fluem, há um halo de mobilidade à sua volta.
    Estão rodeadas pela vastidão, como uma vaga.
    Vê-as de modo mais leve, mais meigo, mais generosamente atento,
    como se fosses um noivo à procura de um rosto a quem amar.
    Olhamos para o céu com a nuca, cheios do nosso próprio ruído, inexperientes. (...)
    Tudo está aberto diante de ti:
    abraça-o com os teus braços e olhos de guerreiro. (...)
    Podes moldar o espaço vivo à tua volta,
    Respirar um vento intenso e fresco como vinho.
    De todo o ar escorre brilho. Move-te e passa! (...)
    Nada existe entre ti e a vastidão quando a terra se ergue nos teus pés!
    Que te mereçam um interesse ardente as mais pequenas coisas
    que contigo se cruzam cada dia.
    Ignoras a minúscula flor que transforma o deserto?
    Pisas o caracol que a chuva trouxe ao teu encontro?
    Reparas no rumo que o pássaro toma ao levantar-se?
    Podes viver como se tudo importasse?
    Então hás de viver!
    O mundo continua a girar agarrado
    ao seu tesouro de conceitos ilusórios.
    A música é efêmera mas existe,
    benéfica, fecunda, impermanente.
    Sonda o significado verdadeiro de tudo
    o que deves levar, trazer ou transformar.
    Pouco há a aprender além do que já sabes:
    és humano e estás só.
    Age como um pássaro capaz de incendiar o próprio ninho.
    Vive, muda, canta e passa!"
    (VERGANI, 2003, p.142-143)

    ResponderExcluir