domingo, 27 de janeiro de 2013

Deus brinca de esconde-esconde



"Deus também gosta de brincar de esconde-esconde, mas como não há coisa alguma fora de Deus, ele só pode brincar consigo mesmo. Contudo, ele passa por cima dessa dificuldade, fingindo que ele não é ele mesmo. Essa é a maneira que ele tem de esconder-se de si próprio. Finge que é você e eu e todas as pessoas do mundo, todos os animais, todas as plantas, todas as rochas e todas as estrelas. Desta forma, tem estranhas e maravilhosas aventuras, algumas delas terríveis e assustadoras, mas que são apenas pesadelos, pois desaparecem quando ele acorda. Agora, quando Deus brinca de esconder-se e finge que é você e eu, esconde-se tão bem que demora muito tempo para lembrar-se de onde e como se escondeu. Mas essa é a parte mais divertida: trata-se exatamente do que ele queria fazer. Não quer encontrar-se demasiado depressa, já que isso estragaria o jogo. E por isso que é tão difícil, para mim e para você, descobrirmos que somos Deus disfarçado, fingindo que ele não é ele. Mas quando a brincadeira já durou muito, todos nós acordamos, paramos de fingir e recordamos que somos todos um só ser, o Deus que é tudo aquilo que existe e que vive para sempre e sempre. Você poderá perguntar por que razão é que Deus, por vezes, se esconde na forma de pessoas horríveis ou finge ser pessoas que sofrem doenças graves e grandes dores. Pense, primeiramente que ele está fazendo isso a si próprio e não a outras pessoas. Recorde, também, que em quase todas as histórias de que você gosta tem de haver gente ruim e gente boa, pois a emoção da história é descobrir como é que a gente boa vai levar a melhor sobre a gente ruim. O mesmo acontece quando jogamos cartas. No começo do jogo misturamos todo o baralho e as cartas ficam numa grande desordem, como as coisas ruins do mundo, mas o objetivo do jogo é acabar com essa desordem, voltar a ordenar as cartas, e acabar com essa desordem, e aquele que se sair melhor será o vencedor. Depois, voltamos a embaralhar as cartas e jogamos uma vez mais - e é isso que sucede com o mundo."
Alan Watts, no livro Tabu.

Alan Watts, a chegada do zen no ocidente


Li uma biografia de Alan Watts, escrita por J.C.Ismael em 1986. Eis um resumo reflexivo:

Um pensador ocidental com a bússola interior apontada, desde cedo, para o oriente.

Nascido em 1915, Alan Watts foi um dos principais divulgadores do zen budismo no mundo ocidental.
Inglês, após o primeiro casamento emigrou em 1938 para os EUA, onde se naturalizou e fez fama, com suas conferências, entrevistas na TV, livros e presença sempre carismática e bem humorada. Um show-man que influenciou a geração beatnik e o movimento hippie. Seus livros eram best sellers e a fonte de contato dos jovens com a antiga tradição do zen budismo que vinha sendo divulgada no ocidente por Suzuki. Um pensador polemizador e uma vida polêmica, especialmente no que diz respeito a suas ideias e práticas de liberdade sexual, bem como as experiências e conselhos no uso de drogas para alterar a consciência (tais como o LSD). Watts viveu e pensou o zen um pouco à sua maneira, diferentemente das escolas e mosteiros zen, com suas disciplinas de meditação e regras de comportamento. Mas mesmo diante das acusações de incoerências pessoais, Allan Watts foi um divulgador e uma fonte de inspiração para um mundo que precisava de seu grito de alerta.

Watts falava do aprisionamento ocidental à cultura materialista do consumo e ao labirinto do "medo de sentir medo." Buscar segurança num mundo em contante mudança é a causa da loucura que vivemos.

"Uma sociedade com base no anseio de segurança não é mais que um concurso de retenção da respiração, em que todos ficam tensos como um tambor e vermelhos como uma beterraba."

Imagine uma sociedade que para fugir do medo gera ainda mais stress? Isso é bem atual.

Entretanto Watts não queria uma importação do oriente como cópia de hábitos e ritos, mas uma orientalização do cristianismo despindo-o da carga pesada de racionalizações teóricas e de rituais sem uma simbologia viva.

Porque o que é o zen?

Um caminho espiritual influenciado pelo budismo e pelo taoísmo onde se busca a realização do satori (iluminação) através da vivência consciente do momento presente, o 'aqui e agora'. Mas para isso é preciso que a pessoa se desvencilhe de todos os bloqueios que a separam da experiência autêntica do real.

O ego é o principal inimigo (como ensinava Buda), e seu artifício é a racionalização, o pensamento através de palavras e conceitos, que buscam constantemente a segurança ao responder as perguntas: quem sou? Que caminho é esse? Como serei livre?

Um círculo vicioso: quem deseja ser Buda, nunca será. Só quando se abandona o desejo, mesmo o de se iluminar, é que a iluminação pode acontecer. Para ser livre, é preciso então desenvolver o não-pensar (taoísmo). Ou seja, a vida autêntica, a vida espontânea, simples e livre só pode ocorrer através dessa experiência direta que transcende o jogo neurótico do pensamento que busca definições, amarras, explicações. Experiência direta: "o som da chuva não precisa de tradução" (Morimoto).

A liberdade do zen é a vida cotidiana vivida sem tensões e especulações cerebrais: "quando tenho fome, como; quando tenho sono, durmo", diz um antigo aforismo zen.

Diz Watts, "O que nós esquecemos é que os pensamentos e as palavras são convenções e que é fatal tomá-los muito a sério... Palavras e medidas não proporcionam vida; simplesmente a simbolizam. Em vista disso, todas as 'explicações' do universo expressas através da linguagem são circulares e deixam as coisas mais importantes e essenciais sem definição e sem explicação."

Um dos mais famosos métodos do zen é o uso do koan. Uma espécie de anedota, ou diálogo, em que o mestre busca ajudar o estudante a romper a lógica racionalista. Alan Watts, em suas conferências e apresentações na TV gostava de usar esse recurso como por exemplo esse poema:

"Tenho as mãos vazias, mas observai a pá na minha mão; vou andando a pé, mas estou montado em um touro. E quando passo sobre a ponte, vede, não é a água que corre, mas a ponte que flui."

Essa linguagem paradoxal (mãos vazias, com pá na mão; a pé e montado no touro) não esconde um sentido oculto ou um enigma. É simplesmente uma estrategia para quebrar o pensamento que gira em círculo vicioso e nos aprisiona na ilusão. O koan busca "o despertar de um sentido interno que permite ao individuo uma visão do autêntico funcionamento das coisas" (Suzuki). Perceber para além do intelecto. Um caminho para despertar a intuição. A ilusão do intelecto nos impede de viver, porque ficamos divididos. E isso significa uma crítica frontal a toda a filosofia do ocidente.

"A filosofia especulativa, como a conhecemos no ocidente, é quase inteiramente um indício da mente dividida, do homem procurando situar-se fora de si mesmo e da sua experiência para poder verbalizá-la e defini-la... a mente indivisível, entretanto, acha-se livre dessa tensão de estar sempre tentando situar-se fora de si mesma e encontrar-se em toda parte, menos aqui e agora."

A busca pelo oriente é, portanto, a tentativa de salvar a filosofia e com ela a civilização ocidental decadente que adoece em suas ilusões consumistas e cientificistas. A própria espiritualidade ocidental (cristã) pode experimentar uma revitalização no contato com o zen e as filosofias orientais.

"O budismo - e o mesmo se pode dizer de certos aspectos do hinduísmo, vedanta, ioga e taoísmo - não é uma cultura, mas uma crítica da cultura, uma permanente revolução não-violenta ou 'oposição leal' à cultura a que está ligado."

Assim como Thomas Merton, Alan Watts valoriza o papel dos contemplativos no mundo. E participa desse debate acerca da tensão entre ação e contemplação, especialmente num mundo que começa a questionar um tipo de ação que leva mais a guerra e ao progresso material do que a um sonhado mundo melhor. A espiritualidade mística dá um frescor às religiões, uma autenticidade que o apego ao dever e aos ritos não alcançam:

"Com a realização da união com Deus, os homens não tem mais necessidade de provar a si mesmos que estão salvos, ficando mais fácil para eles amarem-se uns aos outros, de forma autêntica e sincera e sem qualquer sentimento de inibição. Demonstrarão amor, consideração e misericórdia pelos outros de forma autêntica e sincera não porque isso seja bom, não porque tal conduta lhes assegure estar levando uma vida cristã, mas porque a vida contemplativa lhes dará consciência da presença de Deus em todos os seres humanos (...)"

Outro método para apontar o caminho zen (já que não se pode ensinar o zen, nem mesmo explicá-lo) é o riso. Estratégia constante do bem humorado Watts. Gostaria de encerrar essas citações com uma reflexão, bem no espírito zen, de Christmas Humphreys sobre o riso:

 "Nada existe para ser encontrado; então, por que o esforço para encontrá-lo? Encare a vida com despreocupação, porque ela flui à sua volta e, se você for sagaz, estará fluindo também, cheio de felicidade. Abandone tudo que o preocupa e continue abandonando. Ria, ria ainda mais, mas se não puder rir, descubra o que o impede."


sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Vibrar AMOR


Acabo de chegar da rua, ainda às lágrimas de emoção.

Há umas semanas li numa revista do Instituto Valores Humanos uma entrevista com o Gonçalo (esse aí da foto).
Ele dizia que a vida dele mudou quando começou a praticar o que o Sai Baba ensinou: todos os dias, vibre amor por 10 pessoas que você não conhece. Isso te ajudará a despertar a sua capacidade de amar.

Aí comecei a praticar também.
Hoje pela manhã, após a meditação, dediquei vibrações de amor por 10 pessoas que eu não conhecia. Isso é sempre difícil. Como pensar em quem não conheço? Então às vezes vem na mente um porteiro do prédio vizinho, um motorista de ônibus que peguei no dia, uma senhora do supermercado, etc. Hoje já estava na lista dos 7 e faltavam 3. Aí lembrei do gerente da loja onde compro frutas e dediquei também para duas moças que ficam no caixa.

Bom, tudo normal. A vida segue e fui resolver as coisas do dia.
Na volta do banco passei para comprar melancia para o suco do almoço. Tinha esquecido completamente da oração da manhã.
Qual não foi minha surpresa? No meio da loja, o gerente (nunca tinha falado comigo!) olha pra mim e diz num sorriso, como se fôssemos grandes amigos: "E aí chefe, tudo bem?" E põe a mão no meu ombro. Põe a mão do meu ombro!!! Foi emocionante demais perceber a realidade da oração, da vibração. Eu nem estava pensando nisso, tinha esquecido completamente, mas ele estava todo simpático comigo. Parecia até que ele estava me confundindo com alguém mais chegado. E depois na hora de pagar, a moça falou no final: "Bom dia, querido". Me chamou de querido!!!! É a primeira vez que falam comigo lá, sem que seja a mera resposta de um bom dia, ou um obrigado.

Incrível. Estou muito emocionado com o carinho que recebi dessas pessoas.
Acho que amar é isso. É estar aberto a receber amor.
Fica a dica: todos os dias, vibre amor para 10 pessoas que você não conhece.
Paz, paz, paz!