sábado, 28 de fevereiro de 2015

Aos meus velhos pais


Acabo de chegar de Nazaré Uniluz, uma universidade livre, onde pessoas de diferentes idades estão participando de uma convivência em grupo que durará três meses. Já passou o primeiro mês. Eu fui para uma vivência de uma semana. Meditação, momento presente, trabalho coletivo, respeito ao silêncio individual, trabalhos terapêuticos diversos, liderança compartilhada, espiritualidade... enfim, durante três meses essas pessoas darão grandes passos em seu autoconhecimento, muita coisa vai mudar para cada um, vão descobrir tesouros em si, nos outros, na vida... E ao fim dos 3 meses, quem quiser pode ficar como morador de lá.
Foi lá que conheci a Mariana. Uma jovem de 18 anos.
Enquanto os amigos estão na corrida da formação profissional, de olho no enem e na entrada na Universidade, ela resolveu tirar esse tempo para que possa ouvir de si mesma o que quer da vida. "Eu não sei o que quero fazer, então os meus amigos e as pessoas da minha família não entendem o que eu vim fazer aqui. Nossa! Aqui eu estou aprendendo tanta coisa! Melhor do que estar fazendo alguma coisa que eu não sei se quero pra minha vida. Eles estão tao apressados e acham que eu estou perdendo tempo. Mas acho que é aqui que eu tô ganhando muito".
Ouvindo a Mariana me lembrei imediatamente dos meus 18 anos, e as minhas dúvidas sobre carreira e sentido de vida. E comecei a admirar ali à minha frente uma outra possibilidade de caminhada. Sim, é possível uma outra trajetória de vida.
Aos 18 anos entrei na Universidade e não saí mais. Comecei por fazer Ciências Econômicas. Olhando ali pra Mariana, em fração de segundos revi minha vida na Universidade e me dei conta que passaram-se exatamente 18 anos. Hoje, aos 36, dou aula de Filosofia e Arte e Educação. E percebi que assim como a Mariana estou num momento de dúvidas. Tal qual aquela jovem de 18 anos, a vida está me colocando diante de novas perguntas: será que é isso que eu quero continuar fazendo da minha vida? Eu amo meu trabalho. Mas será que não há nesse momento um chamado para algo diferente? Um outro ofício, com gente diferente talvez?
E ali estava Mariana. Uma menina que resolveu não entrar na Universidade tradicional.
Fiquei impressionado com o encontro das linhas do destino que corre em ciclos e se encontram de 18 em 18 anos.
Vindo de lá, encontrei meus pais, era o aniversário de minha mãe.
E assim como eu tenho o dobro da idade da Mariana, meus pais tem mais ou menos o dobro da minha.
E a conversa não foi outra.
Qual o sentido de vida na velhice? Os filhos criados, o neto já indo para seu isolamento da família típico dos adolescentes... o que resta aos velhos?
Lembramos de pessoas que encontram sentido em serviços altruísticos. Uma senhora que aos 99 anos, todos os dias faz uma roupa para doar a pessoas pobres. E há muitos exemplos.
Mas meu coração não consegue achar uma saída aos meus velhos pais.
O que fazer antes de morrer?
Não sei.
O sentido de vida, aquilo que te dá paixão de fazer, aquilo que desperta curiosidade e um compromisso vital, aquilo que te leva a criar vínculos afetivos, isso é uma coisa muito pessoal. Cada um precisa ouvir o seu. Não tem respostas prontas do tipo faça isso ou, faça aquilo. Cada um precisa escutar dentro de si mesmo, os chamados do coração.
Então acordei hoje de manhã e resolvi escrever esse texto.
Acho que parte do meu sentido de vida é procurar sentido de vida. E parte do meu ofício nessa procura é escrever.
Então aqui está, pai e mãe, esse texto como uma oferta a vocês.
Não tenho a menor ideia do sentido de vida de vocês. Nem mesmo do meu. Mas penso que continuar procurando me dá uma enorme alegria, e no caminho de buscas novas a vida se torna muito interessante.
Agora, não tenho conselhos a lhes dar.
Talvez apenas um conforto, um consolo, em dizer que essa questão do que fazer antes de morrer não é só dos velhos, é do homem maduro e bem sucedido em sua profissão, e da jovem que está começando ainda a se perguntar o que veio fazer aqui. Sim, essa é a questão humana fundamental. E enquanto houver vida, haverá busca. Só posso compartilhar com vocês da minha alegria de continuar sendo um buscador que não chega nunca ao destino final. Sinto que isso é que faz da vida uma jornada tão cheia de surpresas e maravilhas.

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