quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Freud explica: Oxóssi mata a própria mãe


Continuando o nosso diálogo entre o Candomblé e o autoconhecimento vale aqui observar que, a semelhança com as discussões da atual psicanálise, podemos pensar o nosso processo de maturidade em conexão com nosso processo de autonomia frente aos pais, simbolicamente expresso na morte destes. Sabemos como Freud se inspirava na mitologia grega, e aqui um exemplo similar pode ser explorado na mitologia iorubá.

Nessa história, Orunmilá (Orixá do oráculo) fora encarregado por Olodumare (o Supremo Criador dos Orixás) a trazer uma codorna, em tempos de escassez. Parte então em busca de um caçador, Oxóssi.
Vejamos esse trecho:

"Orunmilá apresentou-se e disse da sua vontade de falar com aquele caçador.
Todos se curvaram perante sua autoridade e trataram de trazer Oxóssi à sua presença.
O velho adivinho dirigiu-se a Oxóssi e disse que Olodumare o havia encarregado de conseguir uma codorna.
Seria esta, agora, a missão de Oxóssi.
Oxóssi ficou lisonjeado com a honrosa tarefa e prometeu trazer a caça na manhã seguinte.
Assim ficou combinado.

Na manhã seguinte, Orunmilá se dirigiu à casa de Oxóssi.
Para sua surpresa, o caçador apareceu na porta irado e assustado, dizendo que lhe haviam roubado a caça.
Oxóssi, desorientado, perguntou à sua mãe sobre a codorna, e ela respondeu com ares de desprezo, dizendo que não estava interessada naquilo.
Orunmilá exigiu que Oxóssi lhe trouxesse outra codorna, senão não receberia o Axé de Olodumare.
Oxóssi caçou outra codorna, guardando-a no embornal.
Procurou Orunmilá e ambos dirigiram-se ao palácio de Olodumare no Orum.
Entregaram a codorna ao Senhor do Mundo.
De soslaio Olodumare olhou para Oxóssi e, estendendo seu braço direito, fez dele o rei dos caçadores.
Agradecido a Olodumare a agarrado a seu arco, Oxóssi disparou uma flecha ao azar e disse que aquela deveria ser cravada no oração de quem havia roubado a primeira codorna.
Oxóssi desceu à Terra.
Ao chegar em casa encontrou a mãe morta com uma flecha cravada no peito.
Desesperado, pôs-se a gritar e por um bom tempo ficou de joelhos inconformado com seu ato.
Negou, dali em diante, o título que recebera de Olodumare."

[do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi ]

Iniciando algumas interpretações:
1- Expressa a eterna tendência dos pais sabotarem os planos de autonomia dos seus filhos.
2- Para crescer, o filho precisar romper simbolicamente com os pais, ou seja, com o lugar que os pais insistem em que os filhos fiquem.
3- Para ganhar reconhecimento diante de Deus é preciso seguir seu próprio caminho, sua busca por si mesmo, sua autonomia frente aos pais, tornar-se pessoa, ensimesmar-se.
4- O mito, no entanto, aponta para o fim trágico a que esse processo pode nos levar quando exageramos nessa autonomia, a ponto de não reconhecermos a influencia dos pais em nós, negando também o sentimento de gratidão expresso no "honrar pai e mãe".

Liberdade sim, mas sem orgulho.
A verdadeira liberdade é servir a Deus.
Percebo muito isso lendo esses mitos do Candomblé, e vendo como os Orixás inspiram-nos temor e reverência.
A natureza é muito poderosa.
A Divindade é muito poderosa.
A Humanidade precisa integrar-se e não dominar.
Se baixarmos a crista, teremos esperança!

paz!

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