segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Também sou Batista



E tudo quanto fizer prosperará" Salmos 1, 3.

Tive uma experiência maravilhosa!!!
Nesse domingo acordei as 6hs da manhã para ir a Volta Redonda visitar uma Igreja e um projeto social à convite de uma amiga/aluna da UFF. A nossa querida Gleice tem sido uma luz que irradia à sua volta e estava curioso para conhecer de perto sua comunidade: a Igreja Batista Missionária de Volta Redonda. Foi uma experiência incrível!!!
Me buscaram de carro na rodoviária e fomos ao bairro Santa Cruz.
Que surpresa maravilhosa entrar na igreja marcada pela simplicidade e encontrar um grupo de pessoas, de todas as idades, realizando um estudo bíblico, e todas viraram-se para trás e sorriram espontaneamente como se recebessem um amigo já conhecido de longa data.
É muito bom receber sorrisos espontâneos.
Todos me acolhendo e dando boas vindas.
Me senti, de imediato, num grupo verdadeiramente cristão.
Nem sempre onde há alegria, há cristianismo, mas onde há cristianismo, tem que haver alegria!
Estudos em grupo, momentos de emoção e de compartilhar as interpretações. Acolhimento e real fraternidade. Me emocionei bastante, especialmente com a presença dos jovens.
Depois fui descansar e esperar o almoço, feito ali mesmo, em comunidade.
Conheci o espaço da igreja e do IDE, Instituto de Desenvolvimento Estratégico, uma ONG que atua em diversos projetos, especialmente voltada para o desenvolvimento de pessoas, a partir da infância.
E aproveitei para ouvir as histórias das pessoas, especialmente da missionária que me convidara para estar ali.

Na hora do almoço, a oração foi feita por uma criança. E depois da oração dela (que pelo visto foi envergonhada e silenciosa) ninguém falou mais nada, ninguém a completou. Ou seja, a participação da criança tem a legitimidade de um igual. Aí comecei a perceber que estava realmente num grupo muito especial. Onde a criança tem voz, onde há uma participação livre e legítima das crianças, há uma compreensão humana mais sensível e profunda. Estou com todos os grandes educadores progressistas da humanidade como Rousseau, Pestalozzi, Janusz Korcak e me admirei de encontrar esse espírito no grupo simples ali da igreja.
Mais gestos cristãos: fui servido. E percebi que cada um servia o outro. E o faziam com alegria.
Após o almoço fui finalmente conhecer a Casa Missionária, que fica no bairro vizinho, Santa Rita do Zarur. Estava numa expectativa muito grande de conhecer essa casa porque soube pelas histórias contadas pela Gleice que as pessoas que se decidiam ser missionárias, saíam de suas casas e vinham morar juntas aqui, num mesmo teto, num exercício de renúncia total e entrega a uma causa que, em suas palavras, era para a “Glória de Deus”. Eu ainda não entendia bem como era isso e queria ver de perto. Pude caminhar alegremente com Gleice e sua irmã Gleiciany pelas ruas, debaixo de um sol muito, muito, muito quente e recebemos o alívio numa lanchonete onde tomei um açaí com morango para ficar pra história. E ali ouvimos o dono da lanchonete, o sr. Carlinhos, contar as lembranças dos seus 56 anos na região e de como a paisagem natural se modificou e de como o rio, onde nadava e via sua mãe lavar roupa, foi morrendo com o “progresso” da cidade.
E no caminho, as irmãs falavam e me ouviam com escuta verdadeiramente aberta sobre minhas leituras como estudante das diferentes religiões. Que bom, elas me pareceram verdadeiramente abertas, como encontramos em todas as pessoas de uma espiritualidade legítima. Ouvir o outro só é possível quando não condenamos o seu discurso, mas o aceitamos como legítimo outro. E, para piorar, pobres meninas, também as fiz andar pelas ruas, com o constrangimento de estar ao lado de um homem sem camisa e com um jeito de andar que está longe de um crente tradicional. E isso, ao que me parece, não as incomodou. Gostei de ser acolhido assim. E ali andando, vi a Gleiciany dar mais de 30 “boas tardes” às pessoas da vizinhança e receber de volta talvez uns 3. E isso não diminuía sua simpatia diante das pessoas.
Um pouco mais de sol e... finalmente! A Casa Missionária.
Um espaço maravilhoso! Árvores frutíferas na entrada, um lindo jardim, tudo muito bem cuidado. Frases bíblicas em todo canto. Quarto das meninas, dos rapazes, quarto de um casal, quarto do pastor e sua esposa. Vento fresco, pássaros cantando... A sala, a cozinha onde acontece muita coisa: partilha do alimento, partilha de vidas, admoestações, conversas profundas. O escritório onde o pastor idealiza muitos projetos... fiquei curioso mesmo para compreender o processo criativo dese homem que me parecia mais e mais interessante.
Percebi que a Casa Missionária é a casa dele, aberta às pessoas que decidem vir para o treinamento. Adorei a ideia que me pareceu muito cristã, casa aberta, portas e janelas abertas, me lembrei de Gandhi, um outro herói meu que fundou um ashram de muito trabalho e oração. Lá para cima, o morro onde tem uma trilha com uma vista que diziam ser maravilhosa. Fiquei curioso: quando poderia subir lá?
O pastor Simião chegou. Que figura carismática e simples. Já o conhecera na igreja mas ali pudemos conversar por mais de uma hora. Respeitoso, foi respondendo às minhas curiosidades de pesquisador do mundo psíquico e aceitou falar um pouco de sua história, conversão, mundo mental de sonhos e revelações e de como tudo aquilo ali aconteceu. Há uma similaridade muito bonita com diversos outros grupos comunitários das mais diferentes tradições religiosas, especialmente monásticas. Fiquei curioso por poder ver isso num meio evangélico. E há também muitas singularidades que merecem também uma pesquisa específica (alguém que fazer tese sobre o tema?). A história empreendedora e de liderança do pastor, vem antes da sua conversão, onde já atuava no meio do esporte em sua comunidade em Realengo-RJ. Já era um homem de arrastar positivamente os jovens atrás de si, longe do mundo das drogas e da criminalidade. Já era corajoso e forte diante de um contexto de marginalidade, sendo respeitado por todos.
Nos comovemos quando ele disse da importância de um professor chamado Ivo, da Escola Municipal Lima Barreto (Realengo), quando ele estava com 15 anos, na quinta série, que o ajudou a despertar o desejo de ir além na vida, ultrapassar os limites da pobreza, buscar transformação social. Esse professor de estudos sociais parece realmente vivo no olhar sonhador do pastor Simião, que acredita mesmo em ajudar crianças e jovens a brilharem na vida e construírem um mundo melhor.
Grandes amigos ficamos rapidamente. Um homem na sintonia do bem. Com clareza teológica, especialmente na sobriedade no que diz respeito às profecias, fato que eu iria mais tarde observar no culto da noite: revelações sobrenaturais? teve? que bom. Não teve? que bom também. O essencial é o amor, é a horizontalidade nas relações, é o respeito ao outro, é a promoção social. À luz de Max Weber, ética acima da magia. O que não impede de sentir dentro de si as ideias transcendentes, os chamados, a intuição criativa... Mas garantiu: isso não é o mais importante na igreja. Deus é livre para se manifestar como quiser. Não podemos ficar presos e limitar Deus a se comunicar conosco de um jeito só, me explicou o Aerton, querido amigo que há 14 anos está ali militando ao lado do pastor.

Água no fogo, mais um cafezinho? Mas antes, calçou o tênis e fomos pegar a trilha acima e contemplar a paisagem lá do alto. Gostar de viver, gostar da natureza, dos tucanos, macacos, plantas, jacus e formigas; gostar de pipoca doce. Um líder espiritual com um coração de criança. Que maravilha! E que maravilhosas são essas pessoas que estão aqui convivendo e crescendo como pessoas humanas. Vivendo ali, cada momento é um ato de serviço. Fazer a pipoca ao visitante, receita pastoral, é o maior serviço que se pode fazer a Deus...
Fiquei impactado pela trajetória desses missionários que, como aqueles que optam pela vida religiosa, fazem uma entrega total, deixam a família de origem para servir em outras cidades e mesmo países.
Fiquei fascinado com o contexto no qual essas pessoas tomam “a” decisão. Todas movidas por um impulso de sentido de vida, que vem do coração, num rumo de uma vida nova onde tudo é imprevisto, incerto. É uma entrega que exige o ultrapassar da mente controladora, da mente que quer segurança, que quer planejamentos calculados. É uma ousadia, um jogar-se no risco, um lançar-se na vida, sem se preocupar com o dia de amanhã. Muita coragem em nome de uma única certeza que brota de dentro, num espaço de escuta íntima e transcendente.
Fiquei impactado pela radicalidade de suas escolhas de vida. Lembrei dos meus heróis espirituais como Madre Teresa de Calcutá, e, claro, me envergonhei de mim mesmo. Mas ao mesmo tempo encontrei nessas histórias, algo que estou procurando para mim: a não-mente, o não-controle, o deixar-se surpreender pelo que a vida traz, como é o caso do encontro amoroso. A gente não decide: "agora vou me apaixonar", é algo que acontece. O que devemos é estar de coração aberto ao novo, ao imprevisto, ao inexplicável da vida. Estou amando o inexplicável. E sinto que essas pessoas também. Porque veem a presença do Mistério exatamente nisso. E isso as alegra.

E de coração aberto fui ao culto da noite.
Desci do carro como quem cai do cavalo de um olhar de um pequeno burguês de classe média secularizada que sempre ridicularizou a roupa bonita do povo simples que vai a igreja. Vestir-se bem. Por que não? Com sua melhor roupa, como vovó dizia que devíamos homenagear um aniversariante por exemplo. E por que não na celebração do maravilhoso que é a oração e o encontro com Jesus?

Lindo culto. Simples.

Pastor Simião está em sintonia com o movimento ecumênico ao enfatizar que não se dá dinheiro para receber algo em troca de Deus, que Deus dá independentemente de sua doação. E que a verdadeira doação é de si mesmo, é de renúncia do ego. Um homem contra a maré em tempos de mercantilização da fé. Essa coerência muito me agradou. Músicas, orações sinceras, pregação com boa fundamentação bíblica e aquele gestual todo, aquela corporeidade evangélica maravilhosa. Erguer os braços, por que não? fechar os olhos e se balançar, se prostrar de joelhos, por que não? no caminho do diálogo interreligioso a primeira coisa que aprendi é que para viver a experiência do outro é precisa entregar-se o máximo possível na semântica do outro (inclusive corporal). Diálogo é mais que etnografia, é entregar-se para viver a experiência. E foi maravilhosa. O coração se preencheu de um amor infinito e transbordante, o peito chega a doer de tanto amor. A descrição é impossível, a emoção transpõe palavras. Ali naquele encontro transcendente, acolhido pelos braços amorosos de um sacerdote sincero e honesto, deixei o ego morrer um pouco mais e me integrei na unidade com Deus, com o "algo" que vai governar meu destino, com a comunidade. O ego morre, a vida individual é abandonada para que a vida seja vivida a partir de um outro centro, o Senhor. Se essa entrega é definitiva? É certo que não. Há tanto ego a ser superado, tantas trilhas de montanhas a subir... Se estou convertido? É certo que sim. Como Dom Pedro Casaldáliga, "mudo de Deus a cada dia", e a família espiritual tornou-se ainda maior. Como disse a Gleiciany: sou da família. Só espero que me aceitem assim, como ovelha negra... e branca e amarela e vermelha e azul, na multicolorida diversidade da humanidade da qual sou parte, da abundância dos caminhos maravilhosos, de um Deus maravilhoso, que semeia sua maravilhosa palavra através de pessoas muito, muito, muito maravilhosas.

Gratidão!

Um comentário:

  1. Que linda é sua maneira de encarar a fé, a criança, o outro, o humano...

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