quinta-feira, 24 de março de 2011

Morreu na praça atrapalhando quem passa


Nessa madrugada meu irmão morreu assassinado na Praça.
Foi no Largo do Machado, Rio de Janeiro.
Em frente a belíssima e imponente Igreja de estilo Romano.
Os jornais noticiam:
Morador de rua morto. Dois suspeitos drogados, pedintes. "Aqui é perigoso, pedintes dormem e circulam pela noite", é a fala do morador entrevistado.
Não sei onde está a maior barbaridade
Se no assassinato a sangue frio de um homem que dormia.
Ou se na sociedade que divulga a notícia trazendo a tona o velho discurso da delinquência.
Quem é o pedinte?
Quem é o morador de rua?
Qual a história pessoal, de cada um?
O que leva essas pessoas para a rua?
O que leva os governos a uma incapacidade de ação social que dê conta de uma boa abordagem, abrigamento, educação, saúde, transporte, empregabilidade, reinserção no contexto familiar?
Poderia ser um familiar seu.
Poderia ser eu, você.
Qualquer um pode um dia parar na sarjeta e entrar num labirinto emocional muito complexo de sair.
Meu irmão morreu e fico com a sensação de que há pessoas felizes.
"Menos um."
"Isso era coisa deles, são uns drogados..."
"São perigosos".
O fato de terem brigado e feito ameaça de morte é suficiente para a mídia tornar uma questão particular: "uma coisa deles". Portanto, que se entendam.
Não nego que, nas minhas andanças e convivências com os irmãos das ruas, ouço histórias de brigas, ameaças em alguns grupos mais sofridos e desesperados pela violência da exclusão a que estão submetidos.
Mas se as pessoas estão chegando a esse grau de miséria, uma reflexao séria precisa perguntar pelas causas sociais. Uma questão ética para toda a humanidade atual. Como uma sociedade se permite conviver com esse nível de exclusão? Como permitimos que seres humanos vivam como bichos, ao viver um processo de verdadeira desumanização? Por que não fazemos nada? Não nos envergonhamos diante do testemunho de uma Madre Teresa de Calcutá que foi viver e morrer ao lado dos mais pobres dos pobres? Que interesses tão importantes nos mobilizam a ponto de esquecermos do outro? O que está causando o estrago em nosso cérebro a ponto de não enxergarmos as pessoas como pessoas e aceitarmos como normal uma situação de extremo abandono e miséria?
E mais:
Que tipo de gente está feliz com a morte do seu irmão?
Que tipo de governo se construiria com base nesse tipo de gente?
Pensemos a respeito!

Um comentário:

  1. Querido André, as revoluções são impossíveis até que se tornem inevitáveis. Entendo que nosso modelo político-econômico produz isso, e que a mídia, nós mesmos, tratamos de naturalizar dizendo que "as coisas são assim mesmo". E o pior é que isso acontece todo dia... Que tua indignação se transforme em força! Bj

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