"Não tem como dar errado."
Se ao invés de me colocar como alguém que está criando algo eu me coloco como alguém que está criando a si mesmo não tem como dar errado.
Nove de copas: "Aquilo que já foi vivido é eliminado."
Por que fala?
"Quem me dera ser leal, discreto e silencioso como a minha sombra."
A realidade existencial da sombra...
Primeira história: Acordou de manhã e não era mais a pessoa, mas a sombra. Não decide, não fala, nem mesmo procura a luz ou o escuro, surge e desaparece sem escolha. Ao fim do dia descobre em sua própria realidade existencial a única liberdade possível. Adormece feliz.
"Sacrificar os sentimentos que nos agrilhoam e que nos nutriram."
O que nutre, aprisiona.
Segunda história: Não queria desperdiçar a existência. Passou a vida de forma muito construtiva. Tanto construiu que, ao final da vida, postou-se na torre mais alta que erguera, o lhe valeu grande orgulho, e, lá do alto, foi contemplar o todo de sua obra. Perplexo, deparou-se com os muros de sua própria prisão. Sentiu fundamente o desperdício de sua vida, realizando justo aquilo que tinha mais medo.
O I Ching fala: desintegração.
"Quando o fruto apodrece a semente se desenvolve."
Conservar é não desenvolver.
Terceira história: Após o almoço foi levar as cascas e os restos de comida na composteira do terreno ao lado. Retirou a terra com a enxada, abriu espaço para o lixo orgânico. Tomado de curiosidade, no entanto, quis olhar como andava o que havia deixado na semana anterior. Retirou a terra e as folhas de cima. Estava quente. O alimento apodrecia. Saía fumaça. Pequenos seres ali faziam seu banquete e cresciam. Quis chegar mais perto. Cheirar. Mais perto... e algo extraordinário aconteceu. Lembrou-se do mesmo cheiro do dia do enterro de sua mãe. Chorou a dupla morte: de sua mãe e de suas ilusões. Olhou para o lado e vinha chegando uma serpente que lhe beijou sentidamente o rosto. Ali ficou, o tempo necessário até a troca de pele. Seguiu rastejando com sua mãe, que lhe mostrava, por debaixo das folhas secas das árvores, o segredo da vida. "Partiram em direção a dimensões emocionais mais amplas."
"Queria sentir isso sem achar que vou morrer"
Intensidade! Para além das motivações.
Quarta história: Ator, prestes a entrar em cena. Sente todas as reações orgânicas de seu pânico de público, o mesmo temor e tremor de sempre. Não consegue se acostumar ao hábito. Vai sozinho a um canto atrás do palco, acende uma vela e reza: que dessa vez seja diferente. O anjo vem e lhe pergunta: quer viver sem medo? Sim, é tudo que mais quero. O anjo lhe diz: que assim seja. O ator vai. Sente uma estranha liberdade. A ausência de medo. Porém, não consegue atuar. Está sem vida. Corre de volta a ver se pega o anjo ainda na coxia. Ele está lá, e sorrindo sugere: desfazemos o feito? O ator de olhos baixos concorda: se for dessa vez, que eu vá inteiro. O anjo lhe diz: que assim seja. Sorri, olha nos olhos e o ator não vê o anjo, mas a morte. É você? Sempre fui eu. E o jovem ator diz sem pensar: Fica comigo? Sempre estarei. O ator vai e brilha o seu melhor brilho.
"Não somos meras partes do todo na Natureza, tomamos parte, participamos da atividade infinita."
Liberdade: eu sou a causa de mim. Dos desejos, imagens, paixões, ideias que aqui dentro tomam aparência.
Servidão: deixo-me habitar pela exterioridade, deixo-me governar por ela, e pior, imaginando estar governando-a. Ilusão de força na fraqueza.
Quinta história: ouvia vozes. Aniquilou-se.
Sexta história: nasceu, cresceu, se desenvolveu, se reproduziu e morreu na guerra contra a facção inimiga. Deixou livros, hinos e filhos.
"Sob pressão não tem criação. Pode ter produção. Para criar preciso estar relaxado."
Sétima história: Amou. Silenciosamente. E foi amado.
"Não tem como dar errado."
* * *
Citações em ordem fractal:
Max Antunes
Mariana Amaral
Franz Kafka
I Ching
Fábio Marcoff (clique aqui para assistir o encontro)
Ana ThomazTokkou
Tarot de Marselha
Benedito Espinosa
Alejandro Jodorowski
Hélder Câmara
Eve Idrissi
Eve Idrissi
Ilustração: mão direita enquanto os olhos e os ouvidos assistiam o encontro.
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