Silêncio.
Silêncio. Silêncio.
Pulsar. O
pulsar e o silêncio. O silêncio e o pulsar.
Silêncio
ruim, silêncio duro, “Cala a boca!”
Quanta
palavra presa... Quanta ferida aberta...
Silenciamento.
Invisibilidade.
"Ninguém veio
ao mundo para ocultar-se."
Fala que
cura, fala que liberta. Explosões de fala.
Fala, fala,
fala.
Se abre, se
mostra, se ama.
Silêncio.
Silêncio. Silêncio.
Ouço o som
do silêncio.
Silêncio
bom, silêncio em paz. “Fica mais um pouco, não precisa dizer nada, só fica.”
Quanta
presença boa. A natureza. A pessoa amada. Eu comigo mesmo.
Silêncio que
cura, que organiza, que recomeça.
Palavras são tangentes. O centro é silencioso.
Se olha, se
cuida, se ama.
Fala atenta.
Nobre palavra. Nobre silêncio. Presença.
Fala
dispersa. Tagarelice. Mente agitada. Fugas.
Tento o
silêncio e ouço a profusão de pensamentos agitados.
Não existe
silêncio!
Eckhart Tolle:
tem sempre um ruído, como um rádio ligado. Você pode
fazer silêncio, mas tem sempre um ruído no fundo.
Percebo em
desespero: não existe silêncio! A tagarelice não para!
Os ruídos são as interferências do mundo
ambiente no mundo próprio.
Ouço vozes. Quantas
vozes insisto em carregar?
Biopoder, biopolítica. Servidão.
“Vai ao
coração. Lá reside tua mente.”
Olha as
crianças! Como brincam silenciosas.
Como de
repente explodem.
Como de
repente riem.
Como de
repente conversam.
Como de
repente calam... mudança... mudança... mudança.
Sem
transições.
Qual o segredo?
Em mim, percebo
as mudanças, mas há uma força que não se rende ao fato. E fico remoendo,
ressentindo, recriando, antecipando... ruído, ruído, ruído... o drama, a história,
a imaginação, a ficção, a projeção... eis o alimento da mente dispersa.
Inibir a ação mental que não se rende ao fato. Render-se ao fato. Como simplesmente
esquecer a ficção, a imaginação, o roteiro, o sentido, as explicações e
repousar no fato? É tão arriscado perder todo o drama... nele sou o protagonista
de um épico, onde as maldades são justificáveis, os atos heroicos são
exaltados... Será que nunca vai acabar esse drama?
Uma
história: Vem alguém. Vem alguém. Alguém concreto vem. A mente inteiramente
atordoada, perdida em si mesma, em meio a seus próprios fantasmas. Mas alguém vem.
Quantas vezes um encontro concreto já me tirou do infinito de confusões? O
encontro. O real. O concreto. A diferença. O conflito, o incômodo. O espelho, o
incômodo, a revelação. Sim, está em mim também. Sim sou eu. E de novo volto
para mim: olho, afino, decanto. Trabalho, reconheço, libero-me. Surge um espaço de criação, uma brecha de pensamento livre, um vazio para uma ação. A liberdade num
lampejo. Mas e o outro? A mente insiste. Deixe o outro em seu caminho próprio. E
de tudo isso, algo vai se processando, os fantasmas da mente, a concretude das
ações, das falas, das leituras, dos encontros, até que nova brecha vai se
abrindo. Uma nova revelação. Um novo estado. Um novo vínculo com o mundo. (Se
não tivesse o encontro, o conflito, a fala, mesmo que tagarela, não haveria
esse deslocamento e essa revinculação com o mundo. O outro me abre portas de
vinculação com o mundo, com o território do sistema mais próximo a ele, mais
presente em seu cotidiano. E me aproximo. Dói a dor de dar-me conta de meu
pequeno mundo de outrora. Dói e me move). E de novo o silêncio. A calma. Momentânea
eu sei. Mas um respiro de calma. Contemplo, escrevo, converso. Escuto melhor
agora. Vem alguém? Não tenho pressa que venha agora. Porque agora que aqui cheguei
já não preciso de alguém. Se vier, sorte. Se não vier, sorte também. Agora me
sinto em comunicação com o mundo inteiro. Comunicação: muni é silêncio em
sânscrito. Comunicação é silêncio em comum. Estou pronto para o amor.
A mente no
coração é silenciosa.
A escuta do
silêncio. A escuta do som. O ritmo.
Quem não tem
ritmo é porque não sabe escutar.
Escuto. Mesmo
o silêncio escondido no gesto verbal do outro. Escuto.
Postura de
aprendiz: primeiro e último asana.
Encontro no
silêncio. Encontro silencioso. Como amantes:
“Teresa, quando
você entra em oração o que você fala com Deus?”
“Eu não
falo. Eu escuto.”
“Ah é? E o
que ele te fala?”
“Ele não
fala, ele escuta. Não sei se você consegue entender. Mas é o máximo que consigo
explicar.”
Neste
silêncio em que escrevo ouço as vozes do mundo. Não mais perturbam
minha mente. Ouço a beleza e a tranquilidade do mundo não humano. Ouço o amor dos
humanos (they are really saying: I love you). É o que move cada um. Ouço a
bondade, sem ruído. Percebo e recebo o amor de todos. Eu honro todos os seus
ancestrais. Eu honro a sua existência. E assim, e só agora, estou pronto para
falar.
Falar como
expressão de uma presença. Aqui estou. Junto a essas palavras.
A fala presente. Assim como ando, ando. Assim como respiro, respiro. Assim como falo, falo.
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