segunda-feira, 30 de maio de 2016
Amor e Utopia
Desgastada nos meios sociais a palavra utopia, assim como a palavra revolução, precisa voltar ao vocabulário comum nesses tempos de descontentamento generalizado com a política e as estruturas de poder hegemônico.
Há uma falência moral do sistema político-econômico que se acumula há mais de um século.
O socialismo, que nasceu da utopia comunista, foi a tentativa de construção de um modelo alternativo. Mas ninguém tem dúvidas de que ele se perverteu na mesma competição industrialista, na destruição da natureza e na corrupção das elites tanto quanto seu rival capitalista.
Mas as pessoas continuam sonhando com um mundo melhor.
E esse sonho é legítimo porque nasce de uma experiência.
A utopia nasce da experiência de amor.
O amor se acende na pessoa e se derrama.
Um amor pela vida, uma sensação de plenitude de sentido de viver, uma alegria interior, uma sensação incrível de bem estar, de felicidade.
Então, a pessoa olha para o mundo, as pessoas tristes, as relações humanas que eram para ser amorosas estão deterioradas, cinzas, dominadas pela desconfiança, pelo medo, pela dor... a pessoa que viveu o amor, olha para esse mundo e diz: precisa mudar!
A utopia nasce da felicidade. Porém uma felicidade provisória, que é abafada pelas estruturas do mundo, assim como a poesia é abafada pela rotina. O poeta, porém, vive em outro mundo... o mundo da poesia, do encantamento, vendo beleza, onde o cotidiano vê coisas sem vida. É uma vida solitária. O poeta sofre a cegueira de seus vizinhos. A incompreensão. E alguns poetas sonham em transformar o mundo, num mundo de poesia. Assim é o revolucionário. A revolução nasce da poesia assim como a utopia nasce do amor.
Olhando nosso mundo hoje sinto que há dois movimentos que são necessários.
O primeiro é o cultivo desse mundo novo que virá, a possibilidade de vivê-lo como antecipação. Apesar da dureza do cotidiano, viver poeticamente. Hoje, ele é feito nas micro-relações, nas redes de amigos, uma nova mentalidade centrada no autoconhecimento, na não violência, na ecologia profunda. Há muitas pessoas vivendo isso. Posso dizer que é uma experiência de conexão com o todo, que valoriza a sincronicidade, a conexão com o coração, com o sentimento de amor universal, respeito a si e ao próximo, transparência nas relações, tolerância e valorização das diferenças, o aprendizado do diálogo com escuta atenta, etc.
Isso é real. É concreto. Mas não é para todos. Sinto que há ainda entre nós o grande apartheid social, a cidade partida, e creio que um belo passo seja quebrar esse muro com ações e encontros humanos mais inclusivos. Assim, as pequenas redes que experimentam essa nova filosofia de vida, por não ousar fazer as mudanças estruturais se vê pressionada o tempo todo por uma estrutura de poder calcada em valores muito ultrapassados.
Há uma ideia defendida por esse novo paradigma de que, quando houver uma grande quantidade de pessoas vivendo-o em si mesmos, o sistema hegemônico terá de ceder e as pessoas que hoje vivem a ilusão do sistema serão levadas por contágio a vivenciar a nova era. Será um salto quântico societal. Portanto, há aqui esperanças...
Ao lado desse movimento, há o segundo, que é quando o poeta, além de ver a beleza, faz poesia crítica, poesia denúncia, poesia de protesto. É o movimento profético, que denuncia as estruturas injustas e busca, estrategicamente quebrar o sistema, minar suas forças. Eis que surge a militância política, as pessoas nas instituições que vão fazendo alterações legais e concretas segundo às exigência dos novos valores emergentes. O combate a corrupção bem que pode ser um movimento desses. Os boicotes a certas empresas é outro. As mudanças nos ambientes institucionais... são pequenas batalhas que vai se ganhando no dia a dia.
E assim vai se preparando o dia da grande virada. Quero crer que temos aprendizado suficiente para fazermos essa transformação sem derramamento de sangue. Pelas vias da não-violência, pelo contágio do amor. Essa é a grande poesia da revolução que esperamos... Pois a economia do amor, não pode ser imposta às custas de ódio. Creio que não estamos distantes. Em enquanto isso, façamos a nossa poética diária, e sejamos felizes aqui e agora, ao lado das pessoas com que tomamos café da manhã... (mas claro, se puder, convide para o café alguém que não pode pagar em retribuição, como ensinou um revolucionário utópico do passado...)
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