Sentidos do Amor (Perfect Sense). Um filme lindo,
emocionante, reflexivo, de dar embrulho no estômago em muitas passagens. É a
história de uma relação amorosa nascendo entre uma mulher epidemiologista e um
homem chef de cozinha. Muito boa a escolha das profissões. Porque está
ocorrendo uma pandemia no mundo onde as pessoas estão perdendo gradativa e
quase que simultaneamente cada um dos sentidos do corpo. Olfato, depois o
paladar. Mais a frente a audição e por fim a visão. A mulher diante de uma doença mundial sem explicação. O homem sofrendo com as mudanças em seu restaurante e a impossibilidade das pessoas desfrutarem sua arte.
Interessante que cada perda
do sentido é precedida por uma vivência muito intensa de um tipo de sentimento.
A primeira delas é a experiência de um luto. As pessoas começam a chorar, por
alguma perda significativa. Tempos depois não conseguem sentir mais nenhum
cheiro. O mesmo vai ocorrendo com os demais. Uma fome alucinante vem antes da
perda do paladar, a explosão de raiva antecede a surdez e, interessante aqui,
uma sensação maravilhosa de felicidade e compaixão é o sentimento que acomete a
todos aqueles que irão perder a visão.
A histeria coletiva, os anúncios de fim do
mundo, a busca por culpados, terroristas, etc. são o pano de fundo social para as
tramas de um relacionamento amoroso que começa no abraço consolador da
experiência do luto e se encerra no abraço também compassivo ao ficarem cegos.
As idas e vindas do casal, a forma como lidam com seus sentimentos, tudo isso vão
nos trazendo à reflexão sobre a vida.
Filosoficamente, o filme toca na raiz da nossa
experiência com o que é real. Percebemos o mundo pelos sentidos. É interessante
notar, por exemplo, o nexo entre memória e sentidos. O olfato nos remete a memórias
antigas. A perda do olfato vai apagando também nosso passado. Afinal, quem
somos? quem somos sobre essa terra? somos mesmo quem pensamos ser? quando
ferimos ou carregamos mágoas, quem nos magoou? uma pessoa ou uma onda de sentimento que ultrapassa os sujeitos individuais? somos realmente os mesmos? nossos
relacionamentos são reais? Enfim, um
filme que nos faz pensar muitas coisas.
Pessoalmente gostei da relação entre
sentimentos e sensações, experiências da mente e experiências do corpo. Sinto
que o filme toca no enigma do que os cientistas começam a buscar compreender, e
que tem a ver com as descobertas que os místicos vem fazendo à milênios sobre o
a relação mente-matéria e a existência do que somos. Certamente Buda tem algo a
dizer sobre a impermanência, a partir das suas experiências, dentro da moldura
de seu próprio corpo, no seu caminho de iluminação. Sensações, sentimentos, ideias, tudo possui a natureza de surgir e desaparecer. E o filme, apesar de
trágico em suas conclusões, deixa a sensação final de que ao fim de todos os
sentidos (corporais) resta um sentido (significado) na vida: o amor.
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